Equipe do projeto IMPACTON, coordenado pelo Observatório Nacional (RJ), apresenta seus primeiros resultados científicos em reunião da SAB (Sociedade Astronômica Brasileira)
A gestação de um bebê dura nove meses, mas a de um telescópio capaz de rastrear asteroides -- pelo menos no Brasil -- consumiu nada menos que nove anos. "A boa notícia é que finalmente o IMPACTON é uma realidade", afirmou Daniela Lazzaro, coordenadora científica do projeto e pesquisadora do Observatório Nacional, em conferência realizada durante a 36a Reunião Anual da SAB (Sociedade Astronômica Brasileira), em Águas de Lindóia (SP).
Durante a apresentação, Lazzaro apresentou os primeiros resultados científicos da chamada Iniciativa de Mapeamento e Pesquisa de Asteroides nas Cercanias da Terra no Observatório Nacional (nome que corresponde à sigla IMPACTON). Alguns asteroides já foram rastreados, inclusive um (2011 GP59) que passou a meros 525 mil km da Terra (menos de duas vezes a distância até a Lua), em abril de 2011. "O bichinho andava numa velocidade muito grande, foi um ótimo teste para nós", revelou a astrônoma.
Mas a alegria pelos primeiros resultados científicos se misturou durante a apresentação à angústia gerada pelos entraves impostos pela legislação brasileira à conclusão do projeto. "As dificuldades estão menos ligadas à quantidade de recursos, e mais à falta de flexibilidade para sua utilização", disse Teresinha Rodrigues, pesquisadora do ON que ficou encarregada da infraestrutura do projeto e apresentou o lado administrativo do IMPACTON, na mesma conferência.
A instalação
O observatório, que conta com um telescópio com espelho de 1 metro de diâmetro, foi construído em Itacuruba (interior de Pernambuco), uma cidade com cerca de 4.000 habitantes que oferecia as melhores condições climáticas para os cientistas, com média de 280 a 300 dias sem chuva por ano.
Embora a localização fosse propícia à pesquisa, o isolamento dificultava a empreitada -- poucas empresas se mostravam interessadas em executar trabalhos elementares, como a construção de um muro, em razão da falta de acesso ao local. Para complicar ainda mais, a legislação ainda exigia a realização de licitação para todo e qualquer investimento, por mais simples que fosse. É um processo que consome muito tempo, por vezes sem chegar ao resultado desejado, e o projeto vai ficando mais caro -- com a necessidade de manter gastos operacionais e de manutenção por mais tempo.
Resultado: uma ideia nascida em 2002 só foi concluída em 2011, principalmente por entraves burocráticos. "É uma questão que a gente deseja deixar para reflexão", disse Rodrigues.
Acompanhamento
O foco do projeto IMPACTON e seu observatório dedicado, o OASI (Observatório Astronômico do Sertão de Itaparica), não é encontrar novos objetos que estejam em órbitas próximas à da Terra -- ofertando, portanto, risco de colisão --, mas sim acompanhar aqueles que foram recém-descobertos por outras equipes.
"Tem muita gente descobrindo novos objetos, mas uma coisa que pouco se diz é que 70% de todos os asteroides descobertos pelos diversos projetos de busca são imediatamente perdidos", revela Lazzaro. "É feita uma estimativa rápida da órbita, conclui-se que ele não vai colidir no futuro próximo com a Terra e eles são abandonados. Acontece que essa órbita determinada às pressas tem muita imprecisão."
A ideia é não deixar isso acontecer, pegando o trabalho do ponto em que outros grupos deixaram. Com isso, espera-se criar uma base de dados robusta sobre os NEOs (Objetos Próximos à Terra, em inglês) que permita saber onde eles realmente estão e quais são suas características.
Embora a maior parte dos asteroides próximos à Terra com mais de 1 km (cerca de 700, de um total de aproximadamente 1.000) já esteja devidamente catalogada, a população de objetos de menor porte -- com mais de 140 m de diâmetro, capazes de grande devastação, embora não representem o fim da civilização -- ainda é vastamente desconhecida. Cerca de 5.000 foram observados, de estimados 100 mil.
Há, portanto, muito trabalho a ser feito, sobretudo no céu do Hemisfério Sul, onde há menos projetos de busca de asteroides em andamento.
Até agora, o pessoal do ON realizou seis missões ao OASI, entre março e agosto, para observação e caracterização de asteroides. Mas a melhor notícia veio na semana passada, quando, pela primeira vez, os cientistas conseguiram controlar o telescópio remotamente, pela internet, sem sair do Rio de Janeiro. Com a automação, a tendência é que o número de observações aumente bastante nos próximos meses. E a equipe já trabalha na análise dos dados já coletados para a preparação de artigos científicos para publicação.
( Salvador Nogueira - Comunicação Social da SAB)