O que é um físico?

Uma antiga polêmica vem provocando discussão entre os físicos brasileiros: a necessidade do diploma de graduação para o exercício da profissão. Afinal, o que caracteriza um físico? Para alguns, a graduação é essencial, para outros, o mestrado e o doutorado são mais do que suficientes para formar um profissional da área. O assunto foi levantado no boletim da Sociedade Brasileira de Física (SBF) no mês de abril.

O físico Antonio Guimarães, que começou a discussão no boletim ao criticar a discriminação de físicos com graduação em outro curso em concursos públicos, defende a não exigência do diploma. “Uma pessoa que fez seis anos de mestrado e doutorado em física, após uma graduação em uma área afim que possui diversas disciplinas em comum, está totalmente habilitada a ministrar aulas de física em uma universidade”, afirma Guimarães, que atua no Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP). “Um dos maiores físicos do Brasil, Mario Shindler, possui diploma de matemático”, exemplifica.

Não existe hoje regulamentação para a profissão de física, ou seja, o diploma não é obrigatório para o exercício da profissão. Portanto, para Guimarães, que cursou a faculdade de ciências moleculares e possui mestrado, doutorado e pós-doutorado em física, a exigência de diploma de graduação em concursos públicos, além de não se justificar do ponto de vista prático, viola princípios legais ao impedir que pessoas qualificadas concorram ao cargo. “Por um nome em um papel sou impedido de prestar uma série de concursos para os quais estaria apto”, protesta. “Essa distinção é contraproducente para a ciência.”

Graduação oferece visão geral 

Já para o trio de doutorandos em física da Universidade de São Paulo (USP) Marcello Magri Amaral, Marcus Paulo Raele e Moises Oliveira dos Santos, que elaboraram um manifesto de resposta para o boletim da SBF, o mestrado e o doutorado não substituem a graduação em física. “Na pós-graduação, os assuntos são vistos apenas de forma específica e a carga horária é muito menor”, lembra Marcello Magri Amaral. Para eles, cada instituição deve ser livre para decidir o perfil de seus candidatos. “Se a universidade exige um diplomado em física é porque acredita que para este cargo é imprescindível a formação dada pela graduação.”

Para Marcus Paulo Raele, a desvalorização da graduação prejudica a comunidade dos físicos. “Enquanto engenheiros e químicos podem exercer funções de um físico e prestar concursos para ministrar essa disciplina, o contrário não acontece”, justifica. Já para Antonio Guimarães, a hibridização das profissões é uma tendência mundial.

Propostas de regulamentação

Os três graduados em física acreditam que a polêmica acerca dos concursos é apenas parte de uma discussão maior, a da regulamentação da profissão. “Ela abriria portas para a atuação fora da universidade”, afirma Moises Oliveira dos Santos. “A indústria pouco sabe sobre qual poderia ser a contribuição de um físico. Se os próprios físicos não reconhecem seu papel, é difícil que a sociedade os veja como profissionais que têm algo a acrescentar.”

A SBF produziu um anteprojeto de lei para a regulamentação da profissão. O projeto considera como físicos tanto os que cursaram graduação quanto pós-graduação na área. Entretanto, a falta de uma definição dentro da própria comunidade fez com que a iniciativa não fosse levada adiante. Enquanto alguns físicos sequer consideram necessária a regulamentação, os que a apóiam se dividem quando o assunto é a forma como ela deve ser feita. Mas em um argumento ambos os lados são unânimes: é preciso que os físicos e a sociedade discutam o assunto, pois o debate está longe de chegar a um consenso.